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IMIGRAÇÃO VERMIGLIO
A história de imigração da família Vermiglio
começa como a de muitas outras pessoas que deixaram sua terra natal em busca de
um futuro melhor para os filhos e netos que um dia chegariam. Este relato não é
mais bonito nem melhor do que muitos outros que já passaram por esta revista.
Porém, acreditamos que compartilhando um pouco de nossas vidas, podemos
encontrar respostas e sanar dúvidas sobre o modo como se vivia há décadas e registrar,
em papel, a vida de homens e mulheres dignos de exemplo. As pessoas se vão e as
histórias ficam – e nelas os que se
foram são eternizados.
Devido aos grandes problemas da economia enfrentados
pela Europa na década de 1950 (afinal, a Segunda Guerra Mundial [1939-1945] havia
acabado há pouco tempo e todos os países do continente estavam em
reconstrução), Faro Vermiglio e sua esposa Rosaria Trupiano Vermiglio depararam-se
com um grande impasse, o qual muitas famílias da pequena Balestrate, comuna italiana na região da Sicília,
também tiveram de enfrentar. “Nossa vida no campo está complicada. Está difícil
de sustentar toda a família, e as crianças estão crescendo. O que podemos fazer
para o bem do futuro deles?”, movidos por esta questão, decidiram que o melhor
seria tentar uma vida nova em outro país.
Antes da partida, Faro e Rosaria decidiram
enviar na frente um dos três filhos do casal. O primogênito, Andrea Vermiglio,
tinha compromissos a resolver na Itália e não poderia partir imediatamente.
Então, o casal decidiu mandar o segundo filho, Antonino Vermiglio, que veio ao
Brasil com boa parte das economias da família. A escolha de país não foi por
acaso. Como situação estava difícil, optaram por um lugar no qual a burocracia
documental era mais simples. A vontade de começar uma nova vida era tanta que a
família Vermiglio vendeu a residência em que vivia, passando a morar em uma
menor, para poder pagar as contas desta viagem que seria o marco inicial
de outras que estariam por vir.
Antonino desembarcou em Santos em 1953, aos
20 anos de idade, sem conhecer nada e ninguém. Encontrou um italiano que lhe
disse: “Vai para São Paulo, pois lá tem muito emprego”. E assim o fez. Chegou a
São Paulo, especificamente a São Caetano do Sul, apenas com o endereço de um
barbeiro nas mãos. Este lhe indicou um quartinho, que dividia com outras
pessoas em situação similar. Antonino passou a procurar emprego e tentar
preparar o caminho para os seus entes queridos que haviam ficado na amada
Itália.
Enquanto isso, Andrea Vermiglio terminava o
Exército, após servir por um ano. Pensando na situação em que ainda se
encontravam e no irmão mais novo que se fora à procura de um futuro melhor,
Andrea resolveu também ir para o Brasil, encontrar o irmão para juntos garantirem
melhores condições aos seus pais e ao irmão caçula que ainda estavam na Itália.
Andrea Vermiglio chegou ao Brasil entre
julho e agosto de 1954, encontrou-se com Antonino em São Caetano do Sul, onde
também arrumou emprego. Juntos, procuraram um novo lugar onde pudessem acomodar
seus pais e o irmão Filippo Vermiglio.
Depois de alguma procura, os irmãos alugaram
dois cômodos, onde montaram um quarto, uma cozinha, mas não tinham banheiro
privativo (que era compartilhado com outros inquilinos da pequena pensão). Ali mobiliaram
da melhor forma possível para receber o restante da família. O endereço era na Rua
Maranhão, nº 856, em frente da fábrica de chocolates PAN, que ainda ocupa o
mesmo local.

Com tudo minimamente pronto, Faro e Rosária recebem a tão esperada carta de seus filhos, dizendo que eles poderiam vir ao Brasil após um ano de preparativos.

Em 1 de Outubro de 1954, Faro Vermiglio, Rosária Trupiano Vermiglio e o caçula Filippo Vermiglio, com então 14 anos, desembarcaram no Brasil, deixando para traz a saudades de uma terra onde cresceram, trabalharam e vivenciaram muitas alegrias e tristezas.

O país era outro, a cultura e a língua eram
muito diferentes e ali os Vermiglios recomeçaram toda uma vida de muita luta,
trabalho, conquistas, perdas e ganhos – tudo o que os desafios de uma vida
tendem a oferecer.
A história do caçula dos três irmãos é
particularmente emblemática para se contar a saga da família, portanto, de
agora em diante, focaremos em sua trajetória. Filippo Vermiglio veio da Itália
com o ofício de sapateiro. Desde os 6 anos já dividia seu tempo entre a escola
e o aprendizado na sapataria de seu primo, na Sicília. Aqui no Brasil, como não
sabia falar português, começou a trabalhar na sapataria de um primo, em São
Paulo e, após alguns meses mudou para uma sapataria em São Caetano do Sul, na
Rua Floriano Peixoto, mostrando-se um exímio profissional.
Ainda morando na pensão na Rua Maranhão,
perdeu seu pai devido a uma doença grave. Com pouco dinheiro, Filippo Vermiglio
torna-se um trabalhador incansável, procurando ajudar os irmãos e a mãe, com um
único objetivo: proporcionar a todos um conforto melhor. Quando não estava
consertando sapatos, ajudava os irmãos na construção de suas casas nos terrenos
comprados na Vila Califórnia, em São Paulo, fazendo serviços de pedreiro,
encanador, eletricista e pintor, ou seja, tudo o que era necessário. Quando um deles
tinha dificuldades, os outros irmãos sempre estavam lá para amparar, sempre
unidos e com muito amor, como deve ser uma família.
Em 1959, passeando pela Vila Prosperidade, conheceu na Praça da Riqueza, Maria Amador com 14 anos, uma “señorina” linda, de cabelos longos e olhos com um brilho singular, que viria a se tornar sua esposa em 1964 e lhe daria dois filhos: Epifanio André Vermiglio e José Filippo Vermiglio.

Tudo sempre foi difícil, pois, naquela
época em São Caetano do Sul havia muitos sapateiros, mas Filippo Vermiglio, sempre
foi um trabalhador dedicado. Juntou dinheiro e construiu uma casa na Vila Califórnia
e, em 1973 mudou-se para São Caetano Sul, na esquina das ruas Afonso Pena e
Marechal Deodoro. Uma casa simples que, após ter sido reformada, tornou-se não
só seu lar como também seu local de trabalho, pois ele transformou uma das
garagens de sua residência na Sapataria Itália. A mudança permitiu que ele
economizasse e, o mais importante, que ficasse próximo da família.
Filippo Vermiglio e Maria Amador Vermiglio
conseguiram dar educação e estudo aos filhos, que cresceram brincando
juntos. A união fraternal perdurou até a época de adultos, quando reconstruíram
a casa para acomodar as famílias que estavam formando. A construção foi feita
com as próprias mãos, em processo de mutirão. Depois do expediente, os irmãos,
o pai e os familiares passavam o resto do tempo livre ajudando a edificar as
casas. Foram cinco anos de trabalho duro, mas que valeram a pena.
José Filippo Vermiglio lembra-se de um
momento, durante este processo, quando estava carregando uma lata de areia e
passou pelo cômodo que seria sua sala, e pensou: “Um dia vou estar aqui
assistindo televisão”. Hoje, quando está no conforto de seu lar, recorda-se
daquele garoto carregando a lata de areia. Os membros da família Vermiglio
sempre se ajudaram e fazem o possível para sempre passar o Natal e o Ano Novo
juntos fazendo amigo-secreto, bagunças e tarantelas.
Os anos passam e a idade vem chegando para
o patriarca Filippo Vermiglio. Aos 75 anos, a doença de seu pai vem ao seu
encontro, mas nem isso o abala e ele continuou a trabalhar até o último dia de
sua vida, vindo a falecer em novembro de 2015, após complicações de uma
cirurgia. Mesmo com seu falecimento, seus filhos, noras e cinco netos se reúnem,
sempre que possível aos domingos, e almoçam no estilo de uma tradicional
família italiana. Tem a mesa dos casados, a mesinha dos solteiros, muita
conversa e, por que não dizer, bastante gritaria e brincadeira.
Olhando para trás, a família vê na vida de Filippo
Vermiglio um exemplo de retidão de caráter e atitude positiva perante às
dificuldades, quaisquer que fossem. Admiramos sua dedicação, esforço e o mais
importante, o amor pela família.
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